A leitura que se segue, reproduzida do blog do jornalista Luis Nassif, deve ser feita aos poucos, degustada, até, por ser um instantâneo de uma feroz reação da Folha de S.Paulo, embora sirva de modelito para toda a velha mídia corporativa brasileira, asfixiada pela transparência promovida, na última década, pelo poder desinfetante da internet. Trata-se de uma matéria de boa qualidade técnica, escrita por um grande repórter, Rubens Valente, mas contaminada na origem, por ser uma pauta obviamente gestada pela direção do jornal e colocada em marcha como missão funcional a ser cumprida sob o risco de demisão, em caso de recusa. Assim são as redações brasileiras, em sua maioria, repletas de uma autocracia sumária que destoa, hipocritamente, do discurso editorial quase histérico em defesa de um tipo de liberdade de expressão e de democracia que só interessa quando atende a interesses dos oligopólios de mídia.
Luis Nassif tem sido alvo da velha mídia desde que, há dois anos, decidiu desnudar o reacionarismo da Editora Abril a partir de um bem montado – e bem escrito – “Dossiê Veja”, no qual lista, capítulo a capítulo, a virada neoconservadora da maior revista semanal do Brasil. Trata-se de uma análise de fatos e métodos, reveladora no todo, devastadora nos detalhes. Por causa disso, passou a ser perseguido implacavelmente por um blogueiro de esgoto mantido pela revista em regime de capitão-do-mato, com carta branca para assassinar reputações e despejar baixarias sobre tudo e sobre todos. Agora, chegou a vez da Folha, o mesmo jornal que há poucos dias escalou um dos zagueiros do Instituto Milleniun, Demétrio Magnoli, para chamar de delinquentes dois de seus jornalistas cujo pecado foi o de terem expostos, jornalisticamente, o discurso racista de um senador da República. Imagino que, ainda essa semana, haverá de se escalar, a título de isonomia democrática, um articulista para também desancar a matéria de Valente, na página de Opinião da Folha.
Na “denúncia” da Folha, sobre meu contrato com a EBC, uma demonstração do tipo de jornalismo menor a que Otavio Frias Filho levou o jornal. É um suicídio lento, sistemático, sem retorno.
O programa Projeto Brasil seria renovado com a TV Cultura. Não o foi devido a críticas que fiz a José Serra – conforme consta de respostas que dei ao jornal, sobre as razões de minha ida para a EBC e que foram suprimidas da matéria. Se a intenção fosse ser chapa branca, não faria as críticas merecidas à Sabesp e ao Serra.
Não há um elemento que caracterize irregularidade ou proteção no contrato. Os valores estão claros, dentro da lógica de qualquer programa de TV aberto ou fechado. Foram fixados com base no contrato inicial que mantive com a Fundação Padre Anchieta. E o programa tem importância estratégica para a TV Brasil, conforme se confere no comentário do diretor de programação Rogério Brandão, em email à Helena Chagas, diretora de jornalismo (clique aqui):
O Brasilianas tem a cara da TV Pública! É um programa que estaria na PBS americana facilmente. Penso que com o tempo ele crescerá, e terá um papel relevante na grade. Nossa 2ª feira agora tem um concorrente à altura do Roda Viva.
No próprio texto da matéria fica explícito o motivo da escandalização do factóide: o desmonte do falso escândalo que a Folha criou sobre a Eletronet. Fala em defesa de José Dirceu. Falso! Através de um expediente malicioso, foi a Folha quem fez o jogo do empresário que contratou Dirceu. Era interesse de Nelson implodir o Plano Brasileiro de Banda Larga porque, saindo, matava qualquer possibilidade de ressuscitar a falecida Eletronet e, com isso, de ele ganhar os tais R$ 200 milhões. Se contratou Dirceu para atuar no caso, seria justamente para implodir o PNBL.
Maliciosamente a Folha pegou o contrato dele com Dirceu – passado a ela pelo próprio Nelson dos Santos – para afirmar que visava justamente aprovar o PNBL. A intenção era clara: como Dirceu é estigmatizado, o simples fato de se afirmar que seu lobby seria a favor do PNBL teria o efeito contrário: implodir o PNBL e beneficiar Nelson dos Santos.
Esse tema foi exposto no post “Eletronet: o lobby foi da Folha“. Em “O jogo em torno da Eletronet” avancei hipóteses sobre outros possíveis interesses do grupo em relação ao tema. Em “A falta de rumo do caso Folha-Eletronet” mostrei a tergiversação do jornal, tentando salvar a manobra mudando de direção, mas com os mesmos objetivos, de implodir o PNBL.
Para despertar o espírito corporativo interno, a matéria diz que minhas notas no caso Eletronet tentaram desqualificar jornalistas. Ora, é fato inédito o jornal se levantando em defesa de seus jornalistas. Nesta mesma semana, Otavinho conferiu a terceiro o direito de fuzilar dois jornalistas seus em plenas páginas do jornal, tratando-os como “delinquentes”. Todo jornalista da Folha sabe que, a qualquer momento, poderá ser o alvo da deslealdade de seu chefe, que age assim mesmo.
Quando percebeu que nem os jornalistas suportavam mais o amordaçamento total a que foram submetidos e começavam a pipocar aqui e ali matérias fora desse padrão suicida de manipulação, convocou Demétrio Magnolli para executar exemplarmente dois deles em praça pública: através da página 3 do jornal, em um artigo que os tratava como “delinquentes”. A intenção foi, liquidando covardemente com dois deles (em um tema, cotas raciais, que não tem nenhuma relação com a guerra política empreendida pelo jornal), enquadrar os demais.
Quanto às minhas críticas ao Márcio Aith, jamais atacaria um colega por um erro de interpretação de matéria, ainda que grave. Há outras razões bem mais substantivas, sobre as quais Aith poderá fornecer detalhes. Apenas adianto que ele foi testemunha de acusação contra mim em um caso – a série sobre a Veja – em que tinha sido minha fonte.
Já a Folha, em algum momento do futuro terá que se haver e prestar contas de seus próprios escândalos – inclusive com entes públicos -, que não são meros factóides, com os quais tentou me atingir.
Abaixo, o teor do email que recebi do repórter da Folha, seguido das minhas respostas. É um elemento bastante didático para as escolas de jornalismo, sobre como definir, primeiro, o alvo, e depois sair caçando qualquer coisa que possa ser utilizada contra ele. Depois das respostas, a matéria da Folha.
Leia a íntegra do posto de Nassif aqui.
11/03/2010 at 15:17
Isso é o que se pode esperar de um jornaleco de 5º categoria!
11/03/2010 at 16:00
É inacreditável, Leandro.
Escrevi sobre o mesmo assunto hoje.
O texto pode ser lido aqui: http://wp.me/pgO8c-x2
Abração
11/03/2010 at 17:31
Aliás, me informei sobre o assunto, primeiro, no seu blog.
Forte abraço.
11/03/2010 at 18:13
Não tinha visto.
Rerere
11/03/2010 at 17:09
Não tem importância, a Folha e a Veja não se respeitam mais e são fontes duvidosas.
Gernaide
11/03/2010 at 23:22
Mas estão querendo arrastar os blogs na sua queda…
11/03/2010 at 18:19
Seria interessante dar a versao dos fatos segundo o Magnoli (http://noracebr.blogspot.com/2010/03/hora-e-vez-dos-caluniadores.html).
11/03/2010 at 18:56
Interessante é ele achar que o editor de Opinião da Folha recebe o artigo e, por conta própria, publica o texto sem consultar o diretor de redação. Hahahaha.
Bobinho, esse Mignoli…
11/03/2010 at 19:17
Interessante a teia de solidariedade dos blogs e twitter’s replicando/repercutindo…
Pois é, não acreditando no “poder desinfetante da internet” a velha mídia segue distribuindo tijoladas e subestimando os leitores. Deixe estar.
12/03/2010 at 00:40
eu tenho uma relação muito saudavel com a Folha.
Desembargo no Aeroporto Gov. André DiFranco Montoro na sexta de manhã; com a Folha; destaco o Guia Folha me sento num café peço uma caneta e grifo os espetaculos, exposições e filmes que quero ver.
levanto e jogo TODO o jornal fora, sem abrir. Guardo o Guia comigo.
como o Guia Estadão mudou de formato pra pocket recentemente, nem isso mais eu tenho feito. Compro o Estadão. E repito exatamente o mesmo ritual.
12/03/2010 at 00:41
desembarCo, perdão pela digitação.
12/03/2010 at 01:49
Intrigante ver mísseis contra o Nassif e “palitos de fósforo” queimando a Folha (e outras mídias caducas) via Twitter, blogs e vozes em sua defesa. Solidarizo-me.
12/03/2010 at 07:57
Cabe ipsis litteris para o comentario que deixei no post abaixo.
12/03/2010 at 14:25
A questão é deveras simples: Colhe-se o que se planta. Nassif passa por dificuldades e ataques, mas a cada dia a FSP tem menos assinantes e relevância. Aguardo o melhor detergente, o tempo, que mostrará quem é quem.
O tempo da folha já passou.
Saudações Fraternas
12/03/2010 at 17:14
[…] não apenas numa análise policialesca, mas tentou, de forma irresponsável e estúpida, em “frias retaliações“, como postou Leandro Fortes, promover dúvidas sobre os mesmo, tendo como questão principal […]
13/03/2010 at 10:47
Convido a sua pessoa e seus seus leitores e leitoras, para a abertura dos portões do inferno à zero hoje de amanhã hoje.
Mais aqui
http://josecarloslima.blogspot.com/2010/03/shows-no-purgatorio.html
13/03/2010 at 12:24
Leandro,
com todo o respeito que você possa merecer. Nesse meandro, devo discordar, caro colega Jornalista.
Que me perdoem os nassifistas, mas é a “fria” realidade.
Nassifú é navegante de primeira viagem, um dos mais recentes dissidentes do PiG. Não faz muito tempo, em seu próprio blog endeusava as matérias, os artigos, as colunas, as peripécias dos jornalões Foia e Estadão.
Após sucessivos pés na bunda tomados, mudou de lado e passou a angariar “confian$a” do outro lado, mas os rastros de sujeiras também ficaram impregnados nele.
Louvável, ressalve-se, o dossiê (in)Veja. Mas, frise-se: só o fez quando sua candidatura a postos na Veja e na foia foram-lhe recusados (dizem, por força e interferência do Zé Pedágio).
Nessa briga de cachorro doido, lembro minha vó quando dizia:
“É a briga do sujo, contra o mal lavado”.
Abraços
13/03/2010 at 22:35
O Pulhas de São Paulo, como foi denominado no Cloaca News, é um monte de lixo, há muito deixou de ser um jornal sério para ser um jornalixo.
O Frias é um sujeito raivoso tal qual o cachorro da foto.
15/03/2010 at 03:46
Leandro,
Definições da hora
Cotejando os temas abordados no Millenium e, principalmente, os conferencistas que lá foram vivamente aplaudidos, posso imaginar que se pretende agregar novos significados ao verbete “liberdade de expressão”. São eles:
1. Liberdade de expressão é interditar todo e qualquer debate democrático sobre os meios de comunicação.
2. Liberdade de expressão só pode ser invocada pelos que controlam o monopólio das comunicações no país.
3. Liberdade de expressão é bem supremo estando abaixo apenas do Deus-Mercado.
4. Liberdade de expressão é moeda de troca nas eternas rusgas entre situação e oposição.
5. Liberdade de expressão é denunciar qualquer debate sobre mecanismos para termos uma imprensa minimamente responsável.
6. Liberdade de expressão é gerar factóides, divulgar informações sabidamente falsas apenas para aproveitar o calor da luta.
7. Liberdade de expressão é deitar falação contra avanços sociais, contra mobilidade social, contra cotas para negros e índios em universidades públicas.
8. Liberdade de expressão é cartelizar a informação e divulgá-la como capítulos de uma mesma novela em variados veículos de comunicação.
9. Liberdade de expressão é não conceder o direito de resposta sem que antes o interessado passe por toda a via crucis de conseguir na justiça valer seu direito.
10. Liberdade de expressão é explorar a boa fé do povo com programas de televisão que manipulam suas emoções e suas carências oferecendo uma casa aqui outro carro ali e assim por diante.
11. Liberdade de expressão é somente aprovar comentários aptos à publicação em sítio/blog da internet se estes referendarem o pensamento do autor e proprietário do sítio/blog.
12. Liberdade de expressão é ser leviano a ponto de chamar a ditadura brasileira de “ditabranda” e ficar por isso mesmo.
13. Liberdade de expressão é imputar ao presidente da República comportamento imoral tendo como fundamento depoimento fragmentado da memória de um indivíduo acerca de fato relatado quase duas décadas depois.
14. Liberdade de expressão é apresentar imparcialidade jornalística do meio de comunicação mesmo quando os principais jornalistas fazem de sua coluna tribuna eminentemente partidária.
15. Liberdade de expressão é fazer estardalhaço em torno de um sequestro que não ocorreu há quase 40 anos com a clara intenção de tumultuar o processo político atual.
16. Liberdade de expressão é assacar contra a honra de pessoa pública utilizando documentos de autenticidade altamente duvidosa e depois fazer mea culpa na seção “Erramos”.
17. Liberdade de expressão é submeter decisões editoriais a decisões comerciais de empresas e emissoras de comunicação.
18. Liberdade de expressão é somente dar ampla divulgação a pesquisas de opinião em que os resultados sejam palatáveis ao veículo de comunicação.
19. Liberdade de expressão é não ter visto Lula, o filho do Brasil e considerá-lo péssimo produto cinematográfico sem ao menos tê-lo assistido.
20. Liberdade de expressão é minimizar o descaso do poder público ante as enchentes de São Paulo e reduzir candidato à Presidência a mero poste.
21. Liberdade de expressão é ter dois pesos em política externa: Cuba é o inferno e China é o paraíso.
22. Liberdade de expressão é demonizar movimentos sociais e defender a todo custo latifúndios vastos e improdutivos.
23. Liberdade de expressão é usar uma concessão pública para aumentar os níveis de audiência com o uso perverso de crianças no papel de vilões.
24. Liberdade de expressão é desqualificar quem não aprecia a programação servida pelo Instituto Millenium.
25. Liberdade de expressão é rejeitar in totum toda e qualquer proposição da Conferência Nacional de Comunicação.
26. Liberdade de expressão é apostar em quem ofereça garantias robustas visando manter o monopólio dos atuais donos da mídia brasileira.
27. Liberdade de expressão é obstruir qualquer caminho que conduza mecanismos de democracia participativa.
28. Liberdade de expressão é fazer coro contra qualquer governo de esquerda e se omitir contra malfeitorias de qualquer governo de direita. Ou vice-versa.
29. Liberdade de expressão é fugir como o diabo foge da cruz de expressões como liberdade, democracia, cidadania, justiça social, controle social da mídia.
30. Liberdade de expressão é lutar para manter o status quo: o direito de informar é meu e ninguém tasca.
Fonte: Observatória da Imprensa – por Washington Araújo
17/03/2010 at 14:12
Vamos mostrar a Serra o quanto estamos juntos e como vamos nos multiplicar!
18/03/2010 at 11:17
Leandro, muito boa a sua análise. Obrigada. O pobre do leitor fica perdido em meio a essas informações. Impossível formar opinião sobre as cotas com uma cobertura como a que está sendo feita atualmente pela imprensa (salvo uns poucos resistentes – nada a ver com ideologia). Mas impressiona muito a voracidade com que se contesta os direitos do povo negro.
Ainda bem que existem espaços como este e como os blogs do Nassif e do Olímpio. Obrigada.
19/03/2010 at 12:59
O fim do ombudsman
A Folha de São Paulo ficará dois meses sem ombudsman. Não há qualquer explicação para a lacuna, que seria tratada com a devida gravidade se alguém ainda levasse o jornal a sério.
Mas, realmente, fará alguma diferença? Ninguém espera grandes avanços depois que um profissional atencioso e preparado como Carlos Eduardo Lins da Silva foi incapaz de impedir exemplos de subjornalismo (a ficha falsa de Dilma Rousseff, o dossiê contra Victor Martins, a planilha de gastos do casal FHC, a tentação sexual de Lula), proselitismo reacionário (a Ditabranda e seus congêneres, o antipetismo botocudo) ou favorecimentos corporativos (a defesa da TV paga). Isso tudo em apenas dois anos de atividade.
Nas empresas que se preocupam com a fidelidade de seus clientes, o ouvidor possui função deliberativa: constrange funcionários, arranca soluções, desfaz vícios burocráticos. Já o ombudsman jornalístico virou função decorativa. Uma grife modernosa para criar ilusões participativas no leitor, devolvendo-lhe os invariáveis remedos justificativos das editorias. Convenhamos, é absurdo imaginar que uma empresa de comunicação de grande porte necessita contratar alguém que lhe aponte os erros mais bizantinos. Todo jornalista mediano, diplomado ou não, sabe perfeitamente reconhecer seus desvios cotidianos.
A Folha finge que não deve satisfações aos leitores, como se os seus tropeços administrativos (e seus desvios ideológicos) tivessem um respaldo transcendente e imutável. É esse despeito hipócrita que destrói a reputação do jornal.
06/06/2010 at 21:13
[…] A legenda acima é também o título do texto que Leandro Fortes escreveu em seu blog, sobre o ataque da “Folha” a Nassif – https://brasiliaeuvi.wordpress.com/2010/03/11/frias-retaliacoes/. […]